quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

A Memória

México 86, tinha eu 12 anos. Primeiro grande torneio internacional que tenho verdadeira memória de acompanhar. Espanha 82 pouco ou nada retive a não ser o nome de Paolo Rossi. França 84 passou-me ao lado, não me resta nenhuma lembrança de estar a ver algum jogo.

México 86 já tenho uma memória completa e estruturada. Portugal estava lá, antes só em 1966 tinha jogado uma fase final. Havia Maradona. Havia Zico e Sócrates. Havia Rummenigge. Foi um grande torneio.
 
A prova em si está mais que comentada e documentada, não vale a pena falar, mas lembro-me claramente dum jogo, Escócia-Dinamarca, que não vi. Tenho a vívida lembrança de, entre amigos do meu pai, ser comentado que tinha sido um grande espetáculo. Ou seja, falamos dum jogo que nunca vi e que guardei na memória.

Lembro-me de simpatizar com a Dinamarca, tinham um equipamento altamente icónico, jogavam mesmo muito bem e tinham um jogador que tenho memória de dizer maravilhas, que nunca esqueci o nome, Preben Elskjaer Larsen (sim, lembrava-me do nome assim como escrevi). Mas como o jogo foi tarde e más horas para pré-adolescentes de 12 anos, nada feito, não pude ver (vá lá que o meu pai compensou-me com um tal de Porto-Peñarol em 87 às 5 da matina).

O que despoletou a lembrança de tal facto foi ver um artigo no The Guardian que abordava a famosa selecção da Dinamarca dos anos 80, conhecida pela Danish Dynamite, que eram muito admirados (afinal não era o único, ao que parece) mas nunca ganharam nada. Aconselho ler o artigo (basta clicar no nome do jornal) porque é uma história engraçada.

Tendo o artigo do The Guardian posto contexto na minha passada admiração resolvi por em dia as contas do passado e obter resposta a:

- O jogo foi assim tão bom?
- Preben Elskjaer era assim tão bom jogador?

Comecemos pelo jogador, via wikipédia e outras páginas. Preben Elskjaer era um ponta de lança old school, não muito goleador, muita força, alguma técnica. Em termos de clubes brilhou principalmente em Itália, onde foi campeão pelo Hellas Verona no única vez na história que o foram. No entanto era mais conhecido por ser um bom vivant mulherengo, fumador e amigo da noite. Histórias não faltam sobre as escapadelas do jogador, mas destaco esta:

- Uma vez foi apanhado na noite e foi confrontado pelo seu treinador, no Colónia, que tinha sido visto numa discoteca com uma garrafa de whisky e uma mulher antes dum jogo. Ele respondeu prontamente que era mentira pura, a garrafa era de vodka e eram 2 mulheres.

Dossier jogador, resolvido. Era realmente bom jogador mas a aura por trás era 'outra'.

Dossier jogo, sim, foi um bom jogo mas longe de ser o melhor do torneio. Dinamarca ganhou 1-0, golo de Elskjaer: cavalgada, ressalto, bola metida no poste mais distante. Escócia a atacar muito na 1ªparte, Dinamarca na 2ª. No youtube encontrei um resumo alargado do jogo, o qual deixo aqui:



E pronto, estão feitas as contas com o passado, abrindo uma nova ferida: que raio de calções são esses, oh Escócia?

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

A Lição

É necessário um esclarecimento: o autor destas linhas não é um fã incondiocionável do futebol alemão ou da sociedade alemã em especial (assim como não tem nada contra, exceptuando as palermices politicas). Perante isto, o facto de este post ter presente as únicas equipas que foram mencionadas em post's anteriores é uma total coincidência.


Quem conhece o ambiente no Estádio José Alvalade sabe que existe um conjunto de adeptos que são conhecidos pelo assobio fácil, geralmente virados para os miúdos lançados na primeira equipa. Célebres foram os assobios ao Nani antes da sua ida para o Manchester United, os contínuos ataques ao Rui Patrício que só recentemente se silenciaram, as embirrações com Carriço, etc. Um clube que tem como bandeira lançar jovens da sua formação é confrontado com o elementos da sua massa adepta que ao mínimo erro estão prontos a assobiar. 

Imaginem então que o Sporting está nos últimos lugares, um jovem central é lançado durante uma época muito complicada por lesões de outros jogadores, os resultados não acontecem por vários factores, esse jovem tem 2 erros comprometedores que resultam em golos adversários resultando em derrotas. Não seria complicado perceber que o ambiente se tornaria insuportável para este jogador voltar.

Ainda bem que este é um cenário hipotético ao qual ninguém deseja, no entanto noutras paragens tal aconteceu.

Sexta feira, dia 20 de Fevereiro, um Stuttgart-Dortmund, dois históricos em dificuldades, um jovem defesa central de 18 anos (Baumgartl), que assumiu a titularidade há algumas semanas por lesão de colegas, tem um erro grave que directamente oferece um 3-1 que quase praticamente sentencia o jogo. Na jornada anterior o mesmo tinha acontecido.
Fim do jogo, derrota confirmada, queda para o último lugar da classificação. Jogadores corajosamente vão falar directamente com os adeptos ainda no estádio, entre os mesmos está Baumgartl. O resto...é uma lição de que é realmente ser adepto.


quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

O Amor



Que raio faz um título destes num blog sobre bola? Que demonstração tão pouco máscula é esta? Quem fala em ‘amor’ no mundo pouco dado a afectividades como o da bola?

Calma, a razão existe e está neste pensamento: ‘se há algo de que tenho saudades é do futebol inglês’. Então caro autor, que te falta neste mundo onde tudo está perto? Para o caro autor o futebol inglês está exilado algures na BenficaTV, o equivalente pessoal do mesmo que estar fechado numa caixa fechada a sete chaves e estar afundado na Fossa da Marianas. Temos de ser coerentes com as nossas convicções. 

Porque tenho saudades? Se vermos bem tacticamente não é nada de especial e as filosofias de jogo não são inovadoras. Tem sim uma atmosfera única com base na maneira britânica de viver o desporto, com amor e respeito. Amor ao clube, respeito ao jogo.

O título que tinha para este post era simplesmente ‘A Paixão’, no entanto a premissa foi perdendo fulgor à medida que o texto foi decorrendo: ‘Paixão’ tem uma conotação muito latina, muito ‘descerebrada’, muito de loucura e pouco de respeito pelo adversário e pelo jogo. Um pouco como em Portugal, chegando ao ponto de certas pessoas de se privarem de alguns pequenos prazeres da vida por razões clubísticas (Que tolas! Hm, espera lá…).

Voltando ao cerne da questão, tenho saudades do futebol inglês. Dos jogos loucos onde o ritmo de jogo é absurdo, de ninguém desistir até ao apito final, das famílias inteiras sentadas no estádio, do velhote junto do punk junto do hindu junto do miúdo de 12 anos a cantar em uníssono, das bocas cheias de piada vindas da bancada, do apoio incondicional até ao fim do jogo, da agressividade posta em campo, do respeito dos dirigentes pelo jogo, do respeito dos adeptos pelo jogo, do respeito dos árbitros pelo jogo. Este é o espírito em que o jogo deve ser vivido.

Por isto: ‘se há algo que tenho saudades é do futebol inglês’.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

A Ideia



Comecemos pelo que não interessa neste texto, quem o escreve: um praticante amador  no fim da carreira que nos últimos anos tomou gosto pela componente técnica e táctica do jogo. São estas as minhas credenciais. Para me poder chegar à frente com a certeza de ter conhecimento para partilhar tenho que agradecer os tempos em que vivo, aos quais a distância ao conhecimento é menor, sendo possível chegar às mãos coisas tão inesperados com planos de treino do Barcelona B assinadas por uns tais de Pep Guardiola e Tito Vilanova. E assim encerro esta parte que tem tanto de dispensável como de necessária e falemos do que interessa, de bola.


Em defesa de uma ideia de jogo, o caso Dortmund.


Uma equipa que tem os comportamentos corretos em todos os momentos de jogo e que tem excelentes jogadores à disposição, personalizada numa defesa muito pressionante e num aproveitamento magistral do espaço. É este o Borussia de Jurgen Klopp. Equipa já muito falada e estudada na blogosfera, aqui não há novidade.


O que toma tema de conversa? Esta mesma equipa está posicionada em antepenúltimo da Bundesliga, já a decorrer a 2ª volta, a 1 ponto do último lugar (o Stuttgart, um dos históricos clubes alemães). Voltemos ao parágrafo anterior: que Borussia é este que está nesta classificação? ‘Uma equipa que tem os comportamentos corretos em todos os momentos de jogo e que tem excelentes jogadores à disposição.’ Acrescento eu, nada mudou.


O conceito habitual: equipa que perde ou é dos jogadores e/ou é do treinador. Solução habitual, treinador despedido. Nesta caso é um puro engano, este Borussia faz quase tudo bem e falha onde o treinador não tem controlo, na bola em campo. 


Em todos os jogos que vi do Borussia, excepto o último (Friburgo), o comportamento padrão: jogada bem construída, ultimo passe/finalização falhada, nervosismo, falhanço individual, golo adversário. Por melhor que seja o treinador, por muito boa que seja a ideia de jogo, o papel do treinador está sempre limitado, o que se passa em campo está dependente dos jogadores. E neste caso é o caso típico da influência do estado anímico no rendimento, estar a jogar com o peso do resultado não é o mesmo que o fazer de cabeça mais leve.


Não há melhor defesa para este ponto de vista do que observar o jogo deste último fim de semana, frente ao Friburgo, onde se viu o regresso do Borussia. Na 1ª parte ainda houve algum nervosismo, no entanto a 2ª parte foi uma demonstração de força, onde o resultado foi libertando a equipa do peso da necessidade da vitória e onde foi aparecendo a enorme qualidade da ideia de jogo de Klopp. Nada mais reforça esta minha opinião do que verem a maravilha que foi o 3º golo (aos 36 segundos).




Conclusão, ter pessoas a decidir nos clubes que tenha conhecimento do jogo faz com que Klopp ainda seja treinador do Borussia, infelizmente não é um caso comum. O jogo agradece.